quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Caio Fernando Abreu

E se realmente gostarem? Se o toque do outro de repente for bom? Bom, a
palavra é essa. Se o outro for bom para você. Se te der vontade de viver. Se o
cheiro do suor do outro também for bom. Se todos os cheiros do corpo do outro
forem bons. O pé, no fim do dia. A boca, de manhã cedo. Bons, normais, comuns.
Coisa de gente. Cheiros íntimos, secretos. Ninguém mais saberia deles se não
enfiasse o nariz lá dentro, a língua lá dentro, bem dentro, no fundo das carnes,
no meio dos cheiros. E se tudo isso que você acha nojento for exatamente o que
chamam de amor? Quando você chega no mais íntimo, No tão íntimo, mas tão íntimo
que de repente a palavra nojo não tem mais sentido. Você também tem cheiros. As
pessoas têm cheiros, é natural. Os animais cheiram uns aos outros. No rabo. O
que é que você queria? Rendas brancas imaculadas? Será que amor não começa
quando nojo, higiene ou qualquer outra dessas palavrinhas, desculpe, você vai
rir, qualquer uma dessas palavrinhas burguesas e cristãs não tiver mais nenhum
sentido? Se tudo isso, se tocar no outro, se não só tolerar e aceitar a merda do
outro, mas não dar importância a ela ou até gostar, porque de repente você até
pode gostar, sem que isso seja necessariamente uma perversão, se tudo isso for o
que chamam de amor. Amor no sentido de intimidade, de conhecimento muito, muito
fundo. Da pobreza e também da nobreza do corpo do outro. Do teu próprio corpo
que é igual, talvez tragicamente igual. O amor só acontece quando uma pessoa
aceita que também é bicho. Se amor for a coragem de ser bicho. Se amor for a
coragem da própria merda. E depois, um instante mais tarde, isso nem sequer será
coragem nenhuma, porque deixou de ter importância. O que vale é ter conhecido o
corpo de outra pessoa tão intimamente como você só conhece o seu próprio corpo.
Porque então você se ama também.

Terça-feira de primavera, 23 de setembro, e eu acordei com um verso de Caio F. Abreu na memória "[...]Que me desperte com um beijo, abra a janela para o sol ou a penumbra[...]", foi o dia inteirinho com esse excerto em mente fresca,e junto comigo despertou tambpem meu amor (que estava adormecido) por esse fabuloso escritor, artista... homem!
De lá pra cá (e hoje fazem 8 dias) eu tenho lido e pensado bastante nos seus escritos. Se bem que nestes dias eu tenho andado 'tão down' e Caio, Los Hermanos e Céu (disco Amor e Òdio) tem alimentado esse meu estado de espírito.
Ando(não do verbo andar, mas no sentido de estar mesmo) absorta aqui no meu quarto, viajando entre letras e canções, escritos e melodias, linhas e entrelinhas (principalmente).

p.s: Adoro o texto a cima.